“A meio caminho na jornada da vida encontrei-me numa floresta escura, tendo perdido o caminho.”
(Dante – O Inferno)
A menopausa é um estágio da vida da mulher caracterizado pela diminuição progressiva do fluxo menstrual, devido à diminuição do estrogênio, hormônio que inicia o aumento de sua produção na
adolescência. Acompanham esse processo outros sintomas como ondas de calor, alteração do humor, da libido, do sono, ressecamento vaginal etc., sendo esse um fenômeno natural na vida da mulher.
Mas o que é, ou o que foi a menopausa para cada uma de nós? Como esse momento, essa passagem está inserida e foi significada dentro da nossa história e do nosso contexto de vida?
Qual o nosso papel dentro de um contexto social no qual todas as fases evolutivas da mulher são desqualificadas?
Qual o verdadeiro significado desses rituais de passagem: menarca/puberdade, gestação/maternidade e menopausa, celebrados em tantas culturas ancestrais e tão revestidos de significados negativos na atualidade?
Devido a nossa descendência de uma cultura patriarcal, nem sempre temos companheiros compreensíveis, pacientes, acolhedores, mas este é um padrão masculino que vem mudando à medida que a mulher se empodera na conquista dos seus espaços e ressignifica o seu papel no
núcleo familiar. O homem também passa pela andropausa, só que diferente de nós, assume uma postura de autovalorização, que nós muitas vezes endossamos, camuflando também seus temores e negando muitas vezes a si mesmo a oportunidade de evolução que a chegada
nesse portal da meia idade nos oferece.
Há exatamente um século, as mulheres iniciaram um caminho de empoderamento, assumindo o seu papel de importância no contexto social, político, familiar e histórico da humanidade, mudando a maneira como a mulher vivencia suas fases evolutivas e se coloca no mundo.
A mulher recebeu a missão de gestar, que não se limita apenas à perpetuação da espécie, mas a ser capaz de manter todo o processo de criação. Nós, mulheres, somos capazes com nossa intuição de ouvir o que ninguém fala, de ver o que ninguém está vendo e, com nossa amorosidade, acolher quem não nos pede ajuda. Está em nós o dom de criarmos todo o “setting” favorável para o nosso entorno, seja na nossa casa, no nosso trabalho, nas nossas relações. Somos as facilitadoras do mundo.
“Vamos falar do sentir – um pouco porque o sentir sente e não fala – incômodo , surpresa, cansaço, insônia, irritação, incertezas que surgem tão ou quase sem se anunciar. O que está diante do espelho impressiona mais do que o que está dentro” (Belkiss Nogueira – Amiga, Artista plástica
e Arte educadora).
Com a menopausa, encerramos um ciclo físico de criação. Os sintomas da menopausa são “o que nos falta”, serão mais ou menos frequentes e intensos, dependendo do quanto nesse momento formos capazes de ouvir o que eles nos têm a dizer, do quanto formos flexíveis para a grande mudança que devemos fazer para encerrarmos esse ciclo e abrirmos o próximo, com leveza e alegria pelo novo que virá.
Na primeira metade da vida, damos vida e nutrimos a Persona. Quando chegamos ao meio do caminho, precisamos olhar para a Sombra. Ela representa tudo o que foi reprimido, negligenciado, e negado, a raiva, a sexualidade e o autovalor, mas também lá estão a cura, quando encontramos uma alegria e espontaneidade não assumidas, o gozo sufocado pelo medo, os talentos escondidos de uma criatividade desvalorizada. Na Sombra, encontramos uma parte de nós que tem urgência em ser iluminada. E esse olhar iluminado sobre a nossa Sombra se torna urgente quando, na meia idade, começo a me perguntar:
“Quem sou eu além da minha história e dos papéis que interpretei?”
Muitos dos “transtornos” da menopausa seriam aliviados se precocemente a mulher se preparasse física, mental e emocionalmente para esta mudança. O fim da fase reprodutiva da mulher transforma seu papel social e não deveria mudar o seu “valor”, colocando-a em uma situação de “adoecimento”, de fragilidade, de redução de sua atividade intelectual e física.
Com a menopausa, iniciamos um processo de liberdade para cocriar e criar com sabedoria a nós mesmas e ao nosso entorno, as possibilidades se ampliam.
Por que a mulher sofre com o “ninho vazio”? Talvez, porque algumas acreditem que sua missão terminou, que ela está só, sem os filhos, e que agora aos poucos começará a se tornar dependente deles. Isto muitas vezes é um processo de dor e solidão no qual a mulher não se enxerga.
Geramos filhos para o mundo, essa é a nossa missão, somos o “caminho” que eles percorrerão até se sentirem prontos para assumirem o inicio do próprio caminho e também, um dia, como nós, serem facilitadores do “caminho” de outros que virão.
O Ser feminino tem características próprias, tem seus ciclos evolutivos bem definidos. Seguimos influenciadas pelos ciclos da Lua, nossa natureza é cíclica. Abrimos e fechamos esses ciclos com a sabedoria e experiência acumuladas no ciclo anterior (como diria Ken Wilber – evolui e inclui).
Na medicina chinesa, o meridiano do útero recebe energia do Rim (elemento Água), o qual se liga ao Coração (elemento Fogo), eixo Alto/Baixo. Quando cessa a menstruação, a Energia Vital deixa de ser
encaminhada ao Útero e vai direto para o Coração (Shen Mente – morada da nossa Consciência). Nesse período, há uma diminuição do Yin e aumento do Yang.
Com o aumento do Yang, há uma mudança na dinâmica energética, com o aparecimento dos sintomas, calores, inquietação, insônia, ressecamento da pele e mucosas, que muitas vezes nos dão a sensação de “não sei mais quem sou”.
“A vida só é trágica à medida que se permanece inconsciente da divergência entre as escolhas que fazemos e a nossa natureza” (James Hollis – A passagem do meio).
A “passagem” é a hora que nos olhamos e nos perguntamos:
“Qual o propósito de estar aqui?”
Esse momento é um ponto de mutação do Eu. O foco não está mais no exterior e a chave para realizarmos nosso destino pessoal, em conexão com o Universo, será a flexibilidade física, mental e emocional que mobilizaremos nesse processo de autoconhecimento, consciência, presença e autocuidado.
A energia do Coração traz a Alegria como emoção, o seu som é o Riso e a Fala , e como no Pentagrama, o Coração (Fogo) é a Mãe do Baço-Pâncreas (Terra), que traz como som o Canto, que faz bem ao Coração.
No período pós-menopausa, o ato de procriar, dar existência a algo, dar vida, se transmuta em uma capacidade criadora mais abrangente, que se expande para germinar frutos de uma nova fase que se inicia. Nessa fase, a mulher tem oportunidade de, com sensibilidade e intuição, aliadas a sua capacidade de criar e gerar o novo, e fortalecida por seus aprendizados, acessar uma vivência mais profunda da sua existência.
Com isto, concluímos que “estar na menopausa” não é o fim de uma história de vida, mas um novo começo. Recomecemos, então!
Tania T. Pereira é médica pediatra e neonatologista, homeopata e acupunturiatra (Medicina Tradicional Chinesa e Acupuntura Neuromodulatória), com especialização em Auriculoterapia Francesa e Mobilização da Energia do Subconsciente (Qi Mental).